quinta-feira, 19 de fevereiro de 2015

CUIDADO! Barrigas criminosas sambando por aí.

Nesse carnaval de 2015, duas notícias foram um tanto diferentes das demais. Atípicas dentre tantas que se repetem em toda folia: duas grávidas em estado avançado desfilando como destaques de chão. A primeira, Fabiana, da escola Tom Maior, de São Paulo e a segunda, Andressa, na Mangueira, escola do Rio de Janeiro (minha escola, por sinal). Até aí, ótimo! Ambas desfilaram lindamente e tudo deu certo. Foram maravilhosas e símbolos do carnaval de suas escolas. Nada mais belo, na minha opinião. A notícia, de fato, começou depois dos desfiles, mais precisamente no "tribunal do Facebook", como diria o grande Tom Zé. Quando páginas e perfis começaram a questionar as tais mulheres, e por consequência, todas as demais grávidas, dizendo que as mesmas, por terem desfilado na avenida não têm direito, por exemplo, ao assento preferencial nos ônibus.
O intuito desse texto não é falar exatamente sobre o porquê dessas mulheres, bem como todas as outras grávidas terem direitos ao assento preferencial do ônibus, à fila e caixas preferenciais, à licença maternidade. O intuito desse texto é lembrar, novamente, do quanto o patriarcado continua cruel e do quanto precisamos nos firmar contra esse sistema tão opressor a nós, mulheres.
Recentemente, o assunto gravidez têm estado muito em voga, não é mesmo? Com a posse do senhor Eduardo Cunha na presidência da Câmara dos Deputados e suas declarações sobre o aborto, as campanhas nas redes sociais com mulheres grávidas dizendo #NãoAoAborto e exibindo suas barrigas (como se fosse simples assim), as declarações do senhor Jair Bolsonaro sobre mulheres terem que receber menos "pois elas engravidam".
Pois bem, vamos procurar entender a relação entre todos esses fatos: a mulher vai trabalhar. Recebe menos. Engravida. Se abortar, recorrerá a procedimentos clandestinos e poderá morrer ou ser presa. Se ela não aborta, não pode sentar num ônibus, não pode ter prioridade numa fila, não pode gozar plenamente de sua licença maternidade.
Pensando pelo feto, que seria o ser protegido, quando se falam da criminalização da mulher que aborta: a mulher não pode abortar. Mas se ela ficar em pé no ônibus e o mesmo der uma freada e afetar o bebê, isso pode?
Depois que esse bebê nasce, a mulher, que recebe menos porque engravida, agora recebe menos porque tem que levar esse bebê ao médico. Afinal, que grande estorvo é uma mãe num ambiente de trabalho! Tem mais é que ganhar menos mesmo! Por que resolveu virar mãe? Por que resolveu ter esse filho? Eu, capitalista, não tenho que pagar pelo filho dela. Assim que acabar a estabilidade, vou demiti-la, óbvio!
Pois bem, acho que já podemos concluir daqui. Fica muito nítido o quanto sempre somos criminalizadas por utilizarmos nosso corpo e nossa natureza da forma que desejamos: Somos criminosas quando não queremos engravidar. Somos criminosas quando engravidamos. Somos criminosas quando abortamos. Somos criminosas quando parimos. Somos criminosas quando, grávidas, desfilamos numa escola de samba, mesmo quando nos preparamos meses a fio pra isso. Somos criminosas quando requeremos o banco preferencial no ônibus ou o lugar na fila. 
Há pra onde correr? Não. Sem querer, sem saber, cometemos um crime. O crime de sermos mulheres. Somos criminosas, clandestinas, subversivas, aos olhos do sistema patriarcal. Somos quem deveria se manter sendo um objeto... Mas não o somos! E por isso, cometeremos crimes em todas as nossas ações.