domingo, 11 de outubro de 2015

Carta para Sandra

Oi Sandra. Não vou lhe perguntar se está tudo bem. Não está tudo bem. Nós sabemos o que você teve que fazer e o que aconteceu com você. Sabemos da bebê que saiu do seu ventre, que só não foi criminalizada porque você a escondeu durante nove meses. Sabemos que você pariu essa bebê sozinha, sem nenhum acompanhamento, nenhuma ajuda, nenhum amparo, nenhum afeto, dentro de um banheirinho. Sabemos que você cuidou dessa bebê, a amamentou, vestiu, cortou o cordão umbilical e depois de 1 dia cuidando dela, você a levou.

Mas não, Sandra. Nós não sabemos do seu desespero. Não sabemos o quão agoniantes e horríveis foram todos esses meses, em que você devia pensar, como criar essa bebê morando num quartinho de empregada. Se seus patrões deixariam você criar essa criança na casa deles. Nós sabemos que eles não deixariam. Teriam que arcar com sua licença maternidade, estabilidade, teriam que dar alguma condição de você ficar com aquele bebê ali. Mas será que caberia um berço sequer no seu quartinho da área de serviço? Ou será que eles pagariam pra você fazer um aborto na clínica clandestina, que provavelmente existe em Higienópolis? Não... abortar é um crime muito absurdo. Tão ou mais absurdo, na visão deles, quanto abandonar uma criança. Mas não é crime deixar mãe e bebê abandonadas à própria sorte, não é mesmo? Será que quando você anunciasse que estava grávida, continuaria sendo "praticamente da família"? Será mesmo que ninguém na casa percebeu que você estava em dores de parto?! Como conseguem invizibilizar de tal forma alguém que convive com eles todos os dias?

Imagino você olhando pra Valentina (foi o nome que o porteiro deu à bebê). Imagino o quanto você devia chorar. Pensando em quais traços dela pareciam contigo, quais pareciam com o pai. Pai que sumiu. Pai que sequer quis saber da existência dessa filha. Pai? Que pai? A culpa, dizem que é toda sua. Mas se esquecem que no Brasil, o abandono paterno é algo tão comum quanto trocar de roupas. Pais abandonam na gravidez, pais abandonam durante a vida, pais podem estar dentro de casa e serem tão ausentes, que é como se não existissem. Pais pagam pensão (quando pagam) e pegam seus filhos duas vezes ao mês e mesmo assim se acham super-pais. Quantos sonhos as mulheres deixam de ter pra criar um filho... Será que você ainda tem sonhos? Quem sabe o sonho de poder criar seus três filhos? Três filhos que você não pode ter próximos, não pode aninhar, ninar, cuidar, pois precisa trabalhar pra lhes sustentar. Dois que já estavam aí e a última que, eu sei disso com a força do meu coração, você queria. Será que se tivessem te dado condições, você não estaria com seus três filhos agora, Sandra? Estou certa que estaria.

Sandra, eu não posso mensurar a dor que você está sentindo. Mas eu gostaria de lhe abraçar nesse momento. Eu gostaria que esse mundo não fosse tão cruel, que o patriarcado não existisse, que mulheres não tivessem que se submeter a empregos tão ruins pra ter alguma dignidade, que crianças não fossem abandonadas todos os dias. Sandra, eu queria ter esse poder. Mas o único poder que tenho agora é o de chorar. Chorar por ti, por Valetina. Por tantas Sandras e tantas Valentinas. Sandras que são abandonadas e criminalizadas, Valentinas que crescem por si mesmas, também criminalizadas. Choro ao imaginar você olhando, escondida, as lágrimas escorrendo pelo seu rosto, até alguém resgatar a sua filha. E depois, você tendo que secar essas lágrimas rapidamente, pra patroa não ver o crime bárbaro que você realizou, mas que ela e seu marido, o Estado, o pai são os mandantes.

Sandra, eu talvez nunca te veja pessoalmente. Mas meu coração está contigo e minha luta também. E que um dia não tenhamos mais que viver esse inferno. A culpa disso tudo não é sua. Nem da Valentina. Que vocês duas fiquem bem.

quinta-feira, 17 de setembro de 2015

Voltamos!

É com muita alegria que informo que o Ovelha Vermelha voltou! Ou seja, que a "dona" dele voltou a querer escrever. 
Os motivos são vários. Desde voltar a usar a escrita como terapia e escape pra tantas coisas que têm nos acontecido,a ter um canal pra me expressar, pra ter um pouco mais de voz ativa e replicar a voz de outras pessoas.
Esse canal se propõe a ser um megafone para a juventude, as mulheres, os negros e as negras e para aqueles que querem fazer política séria em Macaé e na região.

Vamos à luta!

terça-feira, 31 de março de 2015

Quem paga mesmo pela crise em Macaé?

Hoje vamos usar um assunto pra falar de alguns, numa cajadada só.
Ontem saiu uma matéria no Jornal Nacional sobre a crise do petróleo e como a mesma têm afetado Macaé. Um casal de amigos meus apareceu na matéria (e foi assim que eu tomei conhecimento dela, pois não vejo mais Globo), que retratava o número de demissões nas empresas off-shore na cidade, colocando a culpa disso na Operação Lava Jato. Ora, esse assunto aqui será secundário, mas é preciso falar que não é pela Lava Jato que há uma crise. A Globo "se esqueceu" que há uma crise generalizada no setor petrolífero, uma crise internacional, que não afeta apenas o Brasil e não é por culpa da Petrobrás. Se esquecem também de explicarem do porquê Macaé passa por problemas hoje devido à crise. E é aí que começamos de fato.
Vivemos numa cidade que detinha um "apelido" muito carinhoso. Macaé era chamada de "Princesinha do Atlântico" e era um agradável balneário no Norte Fluminense... até chegar o ciclo do petróleo e ela passar a ser chamada "Capital Nacional do Petróleo". A cidade passou por inúmeras transformações. Milhares de pessoas vieram morar aqui, em busca de um eldorado prometido (pela grande mídia, inclusive). Para muitos, Macaé era a terra onde "sobrava emprego" e "os salários eram altíssimos". Pois bem. Quem chegava aqui sem qualificação, buscando seu sonho, geralmente dava com burros n'água, mas acabava ficando por aqui mesmo. Ia se aglomerando em bairros como Malvinas, Nova Holanda, Lagomar e a cidade ia crescendo desordenadamente, sem nenhum planejamento, sem nenhuma estrutura para atender àquelas pessoas e, muitas vezes, sem muita opção de outros empregos ou mesmo qualificação. Assim, foram se criando bolsões de pobreza, a criminalidade foi aumentando... Mas os investimentos em políticas públicas continuaram estagnados. E assim, Macaé se tornou uma das cidades mais violentas do estado do Rio de Janeiro.
Quando chegamos no ponto crítico de uma crise grande (que não foi a primeira nem vai ser a última), vemos um prefeito ir aos jornais, visivelmente preocupado, falando da redução de empregos na cidade. O rombo no orçamento macaense é estrondoso e caminhamos para um buraco... Mas por quê? Macaé têm uma arrecadação altíssima de royalties, participações especiais e ISS, correto? Sempre teve. Todos sabemos que o petróleo é um bem natural não renovável, finito. Será que não houve falta de responsabilidade de governantes, inclusive do atual prefeito que já foi secretário em outras gestões, em criar alternativas à economia do petróleo? Não poderíamos ser menos dependentes dessa indústria se quisessem? Se ao invés de usar todo esse dinheiro para pagar comissionados e criar obras faraônicas sem  viabilidade (Parque da Cidade tá aí...)? Macaé poderia ter investido muito mais em educação, em cultura, em saneamento, habitação, em dinamização da economia para trazer qualidade de vida pra sua população. E aí entramos em um outro assunto...
Hoje foi aprovado na Comissão de Constituição e Justiça da Câmara dos Deputados parecer favorável à redução da idade penal para 16 anos. Penso nos meninos da Serra Macaense quando leio essa notícia. Crianças, adolescentes, com más condições de vida, sem acesso à qualificação profissional, lazer, cultura, vindos de escolas ruins (não por seus professores, mas pela desvalorização do poder público) e de famílias sem a menor perspectiva de crescimento de vida. Cuja única diversão é zanzar por aí nas motos dos traficantes, que acabam, sim, sendo seu exemplo de "sucesso" (afinal, qual é a esperança dessa criança em ter uma moto, um carro, uma faculdade ou um bom salário um dia?) e consequentemente quem eles acabarão seguindo, achando que isso pode lhes trazer uma realidade diferente. Que esperança de um futuro diferente damos a eles colocando-os na cadeia? Nem todos têm a felicidade de ter pessoas amorosas, que lhes dão carinho, atenção, puxam orelha nas horas certas, que lhes dão escola boa. Que esperança devem ter aquelas crianças criadas em cima de um lixão nas Águas Maravilhosas? Talvez a esperança de que a terra do petróleo vá lhes dar um lugar no xadrez...
Acredito que antes de apontarmos o dedo para o "trombadinha" de 16 anos, dizendo que "bandido bom é bandido morto", temos que pensar quem é o real bandido nessa história e não, num pensamento de ódio e vingança seletiva, exigirmos prisão e morte para adolescentes, sem ao menos dar a chance de ele ter tentado mudar a vida de alguma forma. Quem vai pagar pela crise do petróleo, certamente não é quem mora "do lado rico da ponte", que tem qualificação, que fala outras línguas. Quem paga pela crise, pela falta de alternativas é justamente a mãe solteira, o pobre, o negro, aquele que terminou o fundamental ou muito mal o médio, o que mora nas áreas mais carentes de cidade. São essas pessoas que vão realmente pagar, com desemprego, com falta de moradia, com a fome, com a falta de opção, com o desespero de não saber o que fazer mais da vida. São essas pessoas, que ainda verão seus filhos e filhas morrerem vítimas de autos de resistência, porque se aqui entram com um fuzil pra cima, na favela entram atirando sem perguntar e menino empinando pipa vira traficante mirim, que merece ser preso, que merece ser morto. Será que é disso mesmo que precisamos pra melhorar os lugares que vivemos? Mais cadeia? Mais ódio, mais mortes? Mais sangue negro derramado? Penso que não.
Vale lembrar que Macaé foi no ano passado a cidade com mais denúncias de trabalho análogo a escravo. Não preciso falar mais nada.
Estamos numa crise financeira sim. Mas também numa crise, ainda maior, de empatia.

domingo, 8 de março de 2015

Suas panelas não nos calarão!

Já escrevi muitos comentários ácidos sobre o 08 de março e os parabéns, flores, bombons e presentes hipócritas que recebemos, como uma compra pelos outros 364 dias de opressões cotidianas, em meu perfil no facebook. Queria escrever algo diferente no blog. Pensei, inicialmente em falar um pouco sobre várias mulheres importantes na história do feminismo e na luta por direitos, mas, há poucas horas, algo mudou o rumo desse post.
O que me fez mudar foi o pronunciamento da Presidenta Dilma Roussef em cadeia nacional. Pronunciamento muito bom por sinal, que me trouxe um certo alívio em meio ao caos. Entretanto, as manifestações em meio ao pronunciamento serão o real motivo desse post. Durante o pronunciamento da presidenta, em várias capitais do país, o que foi realmente notícia foram os "panelaços", onde pessoas, das janelas e varandas de suas casas, se manifestaram gritando entre "fora Dilma" e "fora PT", adjetivos como "vaca", "vagabunda", "piranha". Isso em pleno 08 de março.
Ora, o que se passa na cabeça de uma pessoa que durante o dia dá parabéns e pede respeito às mulheres e, à noite chama uma mulher (independente do cargo de ocupa) desse tipo de coisa? O que se passa senão a mais latente misoginia? Pegar numa panela (será que já tinham pego em alguma antes) para chamar uma mulher de vaca... Entendem o simbolismo que há nisso? Nos dão panelas a vida inteira, dizem que nosso lugar é num fogão e... quando uma mulher alcança o mais alto escalão do Estado, batem em panelas e a xingam pelo lugar que ela ocupa. É como se gritassem: "Volte para as panelas! Seu lugar é junto das panelas!" Assim como imaginam ser o lugar de toda mulher.
Triste fim para um 8 de março, não? Um dia que significa a luta de milhares de mulheres ao redor do mundo por mais direitos, por maior ocupação dos espaços de poder, por mais voz... terminar com uma mulher silenciada de uma forma tão brutal. Muito triste ver que, depois de tantos anos, ainda há tanto a se lutar e o quanto todos os parabéns e flores continuam tão hipócritas quanto há 100 anos atrás.
O problema (para eles) é que seus gritos e panelaços não nos calarão.
Se opressão fizesse-nos calar a boca, já estaríamos mudas. Não nos calaremos! Os Cunhas, Calheiros, Bolsonaros, Felicianos, Neves e tantos outros misóginos não nos verão cair. Assim, como os torturadores não fizeram Dilma abaixar sua cabeça. Nossa luta se fará ainda mais forte ao som das suas panelas, aos seus gritos de "vagabunda", "piranha", às suas ameaças e sua violência. Estaremos ainda mais unidas, mais firmes.
Lutar por Dilma, após esse 8 de março se faz ainda mais latente. Lutar por Dilma hoje tem que ser uma luta de todas as mulheres. Pois lutar por Dilma é sim, lutar pra que um dia tenhamos mais espaços de poder. Pra que ter uma presidenta signifique, enfim, ter direitos iguais. Lutar por Dilma hoje, pra essa que vos escreve, é lutar pra que nós nunca mais sejamos silenciadas
E nós lutaremos, ao seu lado, companheira, irmã, mulher como todas nós. Sua luta é nossa.


Mexeu com uma, mexeu com todas!


Edit: Isso porque não vamos falar disso aqui:
Valeu pela bela homenagem, Globo. Não esperava mais de você.

sexta-feira, 6 de março de 2015

Love Has No Labels

Tudo bem que eu já sou uma pessoa emotiva. Mas gostaria de dividir com vocês algo que me fez chorar e me arrepiar hoje. Está circulando na internet um vídeo de uma campanha chamada "Love Has No Labels" - "O Amor Não Tem Rótulos". O vídeo é emocionante e duvido que não te faça pensar sobre o que vivemos hoje. Através de atos de intolerância, racismo, homofobia, estamos tirando algo de muito precioso das pessoas: a liberdade de AMAR. Nós não escolhemos quem amamos e a sociedade não pode fazer essa escolha por nós. O amor não tem fronteiras, nunca.

Ame. Apenas. E deixe as pessoas amarem também.

Site da campanha: http://lovehasnolabels.com/

quarta-feira, 4 de março de 2015

Declaração de Amor

Amigos e amigas, preciso usar esse blog para me declarar. 

Essas declarações serão frequentes a partir de agora, mas essa é a primeira e confesso estar ansiosa para fazê-lo. Preciso confessar que, apesar de toda a pressão para que eu tenha ódio, repulsa, vergonha... EU AMO O MEU CORPO.
Meu corpo é PERFEITO! Não, ele não é perfeito em detrimento do seu corpo ou do corpo de qualquer outra pessoa. Ele é perfeito pra mim. Ele foi feito exatamente pra mim. Cada curva, cada pinta, cada marca, cada pelo. É meu. É único. E eu os amo.
É do meu corpo que tiro meu sustento, que vivo meus dias. É meu corpo que me proporciona os prazeres e dores da vida e cada coisinha que tem nele é pra isso. Cada pelinho tem sua função, cada odor tem seu papel. Cada fluído tem sua importância.
Fomos ensinadas, mulheres, a nos odiar. Odiar nosso suor, odiar nossos pelos, odiar nosso sangue, nossas formas. Nos põem desde novinhas regras para escondermos nosso corpo. Nos ensinaram que somos impuras, que não podemos nos tocar, não podemos nos explorar, nos conhecer. Nos ensinaram que temos que disfarçar nossos cheiros, arrancar nossos pelos e esconder nosso sangue. Nos ensinaram a ter nojo de nós mesmas! Nos disseram que nosso prazer pertence a outro e não nos deram acesso a ele. Nos criaram para sermos "puras", "castas", "indefesas" e "infantis" e a odiar tudo aquilo que nos fazem MULHER.
Pois eu não quero mais ser o que me ensinaram! Pois é meu corpo, são meus fluídos, meus odores que trazem VIDA! É de mim que sai a coisa mais valiosa do mundo! É o meu corpo que se prepara pra trazer um ser, todos os meses. E sou eu quem decido se trarei ou não esse ser. E mesmo que não o traga, meu sangue, aquele que sai de dentro de mim é sagrado, é puro sim! É vivo! Fertiliza! São meus pelos que me protegem, são meus odores que me identificam. Tenho milhões de motivos pra me amar! Eu sou sagrada!
Nosso sistema, em sua sede de poder e dinheiro nos oprime diariamente. Nos dá sabonetes, lenços, desodorantes, maquiagens, cremes... que nos alteram. Que nos trazem males. Remédios que nos fazem tomar mais remédios, que nos viciam, que nos tiram nosso prazer. Absorventes que nos fazem ter nojo do que temos de mais valioso, pois, ao invés de vermos nosso sangue limpo, vemos sangue putrefato, contaminado por químicas. Negamos nossos corpos e ele reage à nossa negação. Nos torna cada vez mais doentes em cólicas, em problemas hormonais, circulatórios, em distúrbios psicológicos. Nosso corpo nos grita: ME ACEITE! Eu sou a única coisa que você realmente possui!
Aceitei. Aceitei e vou brigar com tudo e todos para aceitar mais ainda. Para meu amor crescer mais e mais. Para não ser julgada, condenada, criminalizada por meu sexo, por meu sangue, por meu útero, meus ovários, minha vagina!
E é por isso que o sistema nos odeia tanto: porque somos, juntas, mais poderosas que ele. Somos a revolução!
Pois somos nós, mulheres, que trazemos ou não a vida. São nossas vaginas e nosso sangue que nutrem o mundo. SOMOS SAGRADAS. Repito: SAGRADAS!
Nos amar genuína e profundamente é enfrentar o patriarcado. Nos amar, genuína e profundamente é amar o mundo. Nos amar é um ato político.



quinta-feira, 19 de fevereiro de 2015

CUIDADO! Barrigas criminosas sambando por aí.

Nesse carnaval de 2015, duas notícias foram um tanto diferentes das demais. Atípicas dentre tantas que se repetem em toda folia: duas grávidas em estado avançado desfilando como destaques de chão. A primeira, Fabiana, da escola Tom Maior, de São Paulo e a segunda, Andressa, na Mangueira, escola do Rio de Janeiro (minha escola, por sinal). Até aí, ótimo! Ambas desfilaram lindamente e tudo deu certo. Foram maravilhosas e símbolos do carnaval de suas escolas. Nada mais belo, na minha opinião. A notícia, de fato, começou depois dos desfiles, mais precisamente no "tribunal do Facebook", como diria o grande Tom Zé. Quando páginas e perfis começaram a questionar as tais mulheres, e por consequência, todas as demais grávidas, dizendo que as mesmas, por terem desfilado na avenida não têm direito, por exemplo, ao assento preferencial nos ônibus.
O intuito desse texto não é falar exatamente sobre o porquê dessas mulheres, bem como todas as outras grávidas terem direitos ao assento preferencial do ônibus, à fila e caixas preferenciais, à licença maternidade. O intuito desse texto é lembrar, novamente, do quanto o patriarcado continua cruel e do quanto precisamos nos firmar contra esse sistema tão opressor a nós, mulheres.
Recentemente, o assunto gravidez têm estado muito em voga, não é mesmo? Com a posse do senhor Eduardo Cunha na presidência da Câmara dos Deputados e suas declarações sobre o aborto, as campanhas nas redes sociais com mulheres grávidas dizendo #NãoAoAborto e exibindo suas barrigas (como se fosse simples assim), as declarações do senhor Jair Bolsonaro sobre mulheres terem que receber menos "pois elas engravidam".
Pois bem, vamos procurar entender a relação entre todos esses fatos: a mulher vai trabalhar. Recebe menos. Engravida. Se abortar, recorrerá a procedimentos clandestinos e poderá morrer ou ser presa. Se ela não aborta, não pode sentar num ônibus, não pode ter prioridade numa fila, não pode gozar plenamente de sua licença maternidade.
Pensando pelo feto, que seria o ser protegido, quando se falam da criminalização da mulher que aborta: a mulher não pode abortar. Mas se ela ficar em pé no ônibus e o mesmo der uma freada e afetar o bebê, isso pode?
Depois que esse bebê nasce, a mulher, que recebe menos porque engravida, agora recebe menos porque tem que levar esse bebê ao médico. Afinal, que grande estorvo é uma mãe num ambiente de trabalho! Tem mais é que ganhar menos mesmo! Por que resolveu virar mãe? Por que resolveu ter esse filho? Eu, capitalista, não tenho que pagar pelo filho dela. Assim que acabar a estabilidade, vou demiti-la, óbvio!
Pois bem, acho que já podemos concluir daqui. Fica muito nítido o quanto sempre somos criminalizadas por utilizarmos nosso corpo e nossa natureza da forma que desejamos: Somos criminosas quando não queremos engravidar. Somos criminosas quando engravidamos. Somos criminosas quando abortamos. Somos criminosas quando parimos. Somos criminosas quando, grávidas, desfilamos numa escola de samba, mesmo quando nos preparamos meses a fio pra isso. Somos criminosas quando requeremos o banco preferencial no ônibus ou o lugar na fila. 
Há pra onde correr? Não. Sem querer, sem saber, cometemos um crime. O crime de sermos mulheres. Somos criminosas, clandestinas, subversivas, aos olhos do sistema patriarcal. Somos quem deveria se manter sendo um objeto... Mas não o somos! E por isso, cometeremos crimes em todas as nossas ações.

sábado, 24 de janeiro de 2015

Manifesto pelo direito de escrever o que eu quiser

Inicio esse novo blog com as seguintes perguntas: Eu tenho que falar SÓ de política? Ou SÓ de música? Ou SÓ de cabelos? Ou posso falar de tudo? Mas tudo MESMO, sem tabus?
No processo de começar de novo a escrever, assisti a alguns vídeos sobre criação de blogs, bem como li alguns textos sobre o assunto. Muitos pediam para escolher um TEMA. 
Tema? Ok, eu posso escolher um tema específico... Eu posso falar de política.
- Aaaaaaaah, mas eu ouvi um álbum tão legal!
- Mas o blog é de política.
- Mas aquele creme de cabelo é maravilhoso!
- Mas o blog é de política.
- Mas e aquele filme...
- O blog é de política.
Então ok. Vamos falar de música.
- Mas o que está acontecendo com as mulheres no mundo..
- Mas o blog é de música.
- Merda.
Que tal um blog feminista?
- Mas blog feminista não pode falar sobre aquele creme MARAVILHOSO pra low poo. Nem daquela arrumação que você fez.
- E por que não, diacho!?

Por que eu tenho que restringir meus gostos e meu mundo para escrever? Por que hoje não posso falar sobre mercantilização do corpo da mulher, amanhã sobre o disco novo do Criolo e depois de amanhã sobre a umectação com azeite de oliva?!
A boa notícia é que o blog é meu e eu posso SIM!
Guardadas as devidas proporções, aqui eu falo o que eu quiser.
Mas podem ficar tranquilos que não vai ter look do dia, prometo (aliás, quer coisa mais fútil?).

Combinamos assim: Eu posto o que eu quiser, você lê se quiser. *bate aqui*